Cachês milionários
No
final de maio, diversos veículos de imprensa noticiaram a polêmica contratação
do show de Gusttavo Lima pela prefeitura de São Luiz, um dos pequenos
municípios de Roraima, no valor de R$ 800 mil. Uma bagatela para não se dizer o
contrário. A apresentação do cantor sertanejo ocorreria na 24ª edição da vaquejada
na cidade, prevista em dezembro deste ano.
Contudo,
o elevado valor chamou a atenção do Ministério Público de Roraima, uma vez que
o respectivo município possui um pouco mais de 8.000 mil habitantes e também um
PIB de R$147,6 milhões (o segundo mais baixo do estado). Deste modo, é como se
cada morador tivesse pagado R$ 100,00 por um ingresso do show, incluindo as crianças
e idosos. O que não faz nenhum sentindo.
Em
resposta, o prefeito de São Luiz, James Batista afirmou que a ideia era
justamente a de impactar a população de Roraima com a contratação do artista
com o maior cachê do país como uma estratégia para atrair uma enorme multidão
de pessoas da região e turistas, movimentando a economia local. Segundo o
prefeito, as estimativas eram promissoras com relação ao retorno financeiro do
evento, já que a previsão era de até cem mil pessoas presentes em três dias de
festejos (sendo 50 mil somente no show de Gusttavo Lima). Nas palavras de
Batista, as receitas que seriam obtidas por meio da vaquejada “permitirão o
pagamento de todas as despesas”.
Ora,
deve ser muito bom fazer estipulações desta magnitude com o dinheiro público e
simplesmente querer contratar os serviços de um dos cantores mais caros do
Brasil. E aqui nos deparamos com três grandes problemas: 1) A inversão de
valores no que diz respeito à falta de maiores investimentos do Poder Público na
saúde e na educação deste país, principalmente quando ainda estamos vivendo um
contexto de pandemia; 2) O dinheiro público sendo gasto de maneira negligente e
esdrúxula por parte daqueles que deveriam administrar os gastos públicos, de
modo a priorizar qual setor merece receber mais verbas; 3) Falta de
transparência nos contratos realizados entre o setor público e o privado, ainda
mais quando ocorrem sem a exigibilidade de licitação:
Art. 25. É inexigível a licitação quando houver
inviabilidade de competição, em especial:
I - para aquisição de
materiais, equipamentos, ou gêneros que só possam ser fornecidos por produtor,
empresa ou representante comercial exclusivo, vedada a preferência de marca,
devendo a comprovação de exclusividade ser feita através de atestado fornecido
pelo órgão de registro do comércio do local em que se realizaria a licitação ou
a obra ou o serviço, pelo Sindicato, Federação ou Confederação Patronal, ou,
ainda, pelas entidades equivalentes;
II - para a contratação de
serviços técnicos enumerados no art. 13 desta Lei, de natureza singular, com
profissionais ou empresas de notória especialização, vedada a inexigibilidade
para serviços de publicidade e divulgação;
III - para contratação de
profissional de qualquer setor artístico, diretamente ou através de empresário
exclusivo, desde que consagrado pela crítica especializada ou pela opinião
pública. - Lei nº 8.666/1993
Não
está no gibi a quantidade de artistas famosos que receberam ou estavam prestes
a receber verbas públicas de prefeituras e governos estaduais para apresentarem
seus shows a um preço elevadíssimo, sem licitação ou qualquer prestação de
contas, dentre eles: Anitta (por R$ 500 mil), Cesar Menotti e Fabiano, Bruno e
Marrone (por R$ 520 mil), Israel e Rodolffo (por R$ 310 mil), Zé Neto e
Cristiano (R$ 400 mil) e tantos outros que a população nem imagina. O cachê
milionário de Gusttavo Lima ou “Embaixador” como é artisticamente conhecido,
chegou a custar R$ 1,2 milhão na contratação com a prefeitura de Conceição do
Mato Dentro, no interior de Minas Gerais. Um absurdo! Porém, após as
investigações e o escândalo da notícia na mídia, a contratação foi cancelada.
Quem diria que muitos destes artistas que criticam o Governo Bolsonaro têm o dedo podre sempre apontado para os outros e menos para si, embora, o bolso esteja socado de dinheiro. E quando abrem a boca para chamar o Presidente Bolsonaro de genocida, se esquecem de que este dinheiro público poderia estar salvando vidas. Portanto, podemos chamá-los de cúmplices deste “governo genocida” que eles tanto malham e condenam? Com ressalvas para o fato de que estamos falando de contratações feitas por prefeituras e estados, ou seja, o chefe do executivo federal não tem nada a ver com isso. Afinal de contas, não tem como o Presidente da República saber o que acontece em cada esquina deste país, ainda mais quando se trata de acontecimentos ocorridos em pequenos municípios situados em diversas regiões do Brasil.
Chega
de falsos moralistas! As máscaras de muitos caíram e devemos agradecer a dupla
sertaneja Zé Neto e Cristiano por terem sido as pessoas responsáveis por alertar
o Ministério Público do Mato Grosso sobre as contratações milionárias entre o
Poder Público, cantores sertanejos e artistas de outros gêneros musicais. Mas
em qual sentindo eles foram peças-chave do quebra-cabeça das investigações que
começaram a ser feitas em vários estados brasileiros?
Numa
apresentação realizada em Sorriso, Zé Neto fez críticas à cantora Anitta e à
Lei Rouanet: - “Sorriso, Mato Grosso, um dos estados que sustentou o Brasil
durante a pandemia. Nós somos artistas que não dependemos de Lei Rouanet, nosso
cachê quem paga é o povo [...]”. Apesar de criticar o uso de verba pública, foi
verificado de que a dupla sertaneja também foi contratada pela prefeitura para
a festa do município, no valor de R$ 400 mil. Em outras palavras, tudo farinha
do mesmo saco.
Abre-se
uma rápida janela para debater a questão da Lei Rouanet, que sofreu
modificações após Jair Bolsonaro assumir a presidência, reduzindo cachês dos artistas
e impondo limites para pagamento com recursos da lei que passou a ser de R$ 3
mil por apresentação (antes podia chegar até R$ 45 mil). Muitas das vezes, o
problema não está necessariamente na lei, mas na maneira como ela é aplicada e
como as pessoas tiram proveito econômico dela, acima do permitido. Convenhamos que
a mamata existe até mesmo entre os artistas e não só entre políticos corruptos.
Uma pena que os artistas menos favorecidos e desconhecidos pagam o preço dos
grandes.
Ressalta-se
a importância do lazer e do entretenimento na vida das pessoas, sendo legalmente
possível a contratação de artistas sem licitação com base no art. 25, III, da
Lei nº 8.666/93. No entanto, os gastos devem ter correlação com a realidade
financeira e orçamentaria da cidade para não ferir, menosprezar ou afetar
outros direitos que também são assegurados em lei. O povo brasileiro quer mais transparência,
honestidade e ética nas ações que envolvem verbas públicas, de modo a querer saber
aonde vai o dinheiro daqueles que pagam seus impostos e cumprem com seu dever.
Foto: Reprodução/Twitter - chargista Fraga
Fontes:
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