O pequeno gigante

           


Mais um lastimável caso de racismo aconteceu recentemente envolvendo um motoboy e um morador de determinado condomínio residencial de alto padrão em Valinhos, São Paulo, tendo uma grande repercussão nas redes sociais a partir desta sexta-feira (07/08).

Pelas imagens captadas pela câmera de um vizinho, é possível ouvir as inúmeras ofensas proferidas pelo contabilista Mateus Couto ao motoboy, sendo também visível o momento em que o sujeito faz um gesto, tocando o braço esquerdo com a mão direita e esfregando a pele com os dedos.

Para quem não está familiarizado com este meneio, ele normalmente costuma ser utilizado para expressar pessoas de cor, ou seja, pessoas negras ou pardas. Contudo, vale ressaltar que este gesto é totalmente racista, praticado com o intuito de inferiorizar a cor negra. No caso específico, o morador valeu-se do gesto para enaltecer o seu próprio tom de pele, ao insinuar que o entregador teria inveja da sua cor branca.

Aos que ainda não acreditam na existência do racismo, vale a pena assistir ao vídeo para testemunhar um tipo de comportamento que vem se repetindo ao longo da história, perpetuando-se na cultura brasileira. Entretanto, já aviso de antemão, que o conteúdo do vídeo é repugnante.

É muito triste, inclusive vergonhoso, ver um ser humano humilhando um semelhante simplesmente pela diferença social e de cor. A troco de que? Para se sentir melhor e superior do que o outro? Superior em que sentido? Pois ao meu ver, a pessoa já demonstrou ser um indivíduo de pouco caráter, detentor de valores baixíssimos e totalmente destorcidos.

Convenhamos que bom caráter, senso crítico e valores morais e éticos valem muito mais do que qualquer montante ou status social. Infelizmente, parece que estes conceitos estão em démodé ou as pessoas estão com preguiça de exercitá-los e de ensiná-los corretamente. Além disso, há pessoas mal-educadas e de má índole neste mundo, independente de classe social. Isso é um fato que temos que aceitar. Uma pena que haja um grande grupo de pessoas com a convicção de que se pode comprar tudo com dinheiro. Como estão equivocadas, afinal de contas, respeito não se compra.

O próprio Matheus Pires é a prova disso ao não se deixar intimidar com as ofensas que lhes foram direcionadas, se mantendo cordial durante todo o tempo em que conversou com o morador. Este, por outro lado, se mostrou bastante alterado e expôs uma raiva sem tamanho, simplesmente porque Matheus atrasou a entrega do pedido.

Neste momento em que estamos vivendo, a categoria profissional de motoboys está sendo de extrema importância para evitar que muitas pessoas vão para as ruas, especialmente as que pertencem ao grupo de risco. Muitos deles, inclusive, trabalhando sem a devida proteção e arriscando a própria vida para facilitar e preservar a vida de tanta gente. Assim como os médicos e enfermeiros, eles estão na linha de frente todos os dias, entregando comida, remédios, dentre outros produtos.

Portanto, acredito que Matheus Pires, assim como tantos outros entregadores, merece respeito pelo nobre trabalho que está realizando durante a pandemia. Lamentavelmente, muitas pessoas não dão o devido valor por se tratar de uma profissão humilde e de baixa remuneração. Contudo, está sendo a atividade que vem poupando vidas e ao mesmo tempo, mantendo grandes e pequenas empresas ativas.

Um detalhe que me chamou bastante atenção no vídeo foi o fato do morador ter se vangloriado a respeito do próprio nome, afirmando ser um nome bíblico. Entretanto, quando Matheus Pires lhe informou o seu nome, também dizendo que era bíblico, o indivíduo duvidou e riu, sugerindo que o motoboy estaria mentindo sobre sua identidade.

Mas o motoboy estava dizendo a verdade sobre si mesmo e apesar das grafias serem distintas, os dois cidadãos possuem nomes iguais. Que inusitada coincidência da vida, não é mesmo?

A polícia local foi acionada e já começou a investigar o caso. O contabilista e ofensor que se chama Mateus Abreu Almeida Prado Couto está sendo acusado por injúria racial. No momento, nos resta apenas aguardar o pronunciamento do Ministério Público Estadual para que o processo penal seja instaurado e justiça seja feita.

Diante das circunstâncias, o pai do contabilista já se pronunciou publicamente, alegando que o filho é portador de uma doença psicológica bem complicada: esquizofrenia. Caso realmente seja confirmada a existência desta doença, o acusado Mateus Couto não poderá sofrer uma ação penal, por ser considerado inimputável para fins legais. Desta maneira, o acusado ficará isento de sofrer qualquer tipo de pena, contudo, lhe será imposta a medida de segurança.

Por fim, será que uma doença pode ser utilizada como desculpa pelo comportamento racista de Mateus Couto? Pois acredito que o preconceito que ele cultiva dentro de si é da essência de sua pessoa e, que infelizmente, mesmo estando doente, continua a se manifestar. 


Foto: Ilustrador Petit Abel/ Instagram @petitabel


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