A gerente (e as redes sociais) vs O pintor

 


Na era tecnológica em que se vive, as redes sociais possuem forças ocultas que podem ser usadas tanto para o bem quanto para o mau. Tudo dependerá da maneira como as plataformas digitais são manuseadas, quais os verdadeiros objetivos por detrás de cada postagem efetuada e acima de tudo, do senso de responsabilidade social que cada internauta deve ter para com o tipo de conteúdo que posta na internet e para com aqueles que terão contato com os respectivos materiais.

Contudo, é perceptível uma quantidade imensurável de postagens diárias e aleatórias no Instagram, TikTok e Twitter, sem o devido cuidado ou preocupação com a repercussão que possa ter ou gerar na vida de determinadas pessoas. Afinal de contas, todo mundo que filmar algo inusitado e bacana para publicar nas redes sociais e obter os desejados “likes” e clã de seguidores.

Para piorar ainda mais a situação, muitos cidadãos, que tem um celular na mão, consideram-se justiceiros, donos da verdade ou jornalistas mais consagrados de todos os tempos e saem postando tudo o que vê/lê pelas telas, sem nem ao menos apurar a veracidade dos fatos. Não há o comprometimento com a informação e sim, com a repercussão sensacionalista que pode derivar dela.

Infelizmente, as pessoas estão perdendo a noção dos limites morais e éticos existentes na vida real, pois a internet é uma terra sem dono, onde uma grande maioria se acha no direito de dizer e fazer o que quiser, sem se importar com as consequências morais e até jurídicas de seus atos. Muitos, inclusive, criam perfis “fakes” justamente para ofender, humilhar outras pessoas, postar conteúdos sem qualquer critério de apuração e cometer crimes.

Por outro lado, não se pode negar os benefícios que a tecnologia vem proporcionando para a sociedade, no sentindo de agilizar e democratizar a informação, além de permitir que cidadãos comuns também possam produzir conteúdos próprios. Com isso, passou-se a ter uma quantidade enorme de informações circulando na internet, entretanto, sem a devida credibilidade, qualidade e, muitas das vezes, analisada sob um único ponto de vista.

Casos como o do motoboy Matheus Pires, vítima de racismo; o fiscal da vigilância sanitária que foi desrespeitado por um casal; o Desembargador que maltratou o servidor público; o policial que invadiu o apartamento de jovens mulheres e usou da violência física, dentre tantos outros, tornaram-se de conhecimento público somente em razão de filmagens não oficiais. Fatos que chocaram o Brasil e tiveram repercussões alarmantes nas redes sociais, indignando centenas de milhares de pessoas pelo país.

Será que teriam a mesma repercussão caso não tivessem sido filmados? As pessoas ainda iriam se indignar se os casos tivessem sido relatados de uma maneira diferente? Ou será que muitos gostam apenas do sensacionalismo e de ver a miséria alheia?

É inacreditável a enxurrada de postagens e “tweets” de internautas escrevendo coisas terríveis, baboseiras sem limites, desejando o mal para muitas pessoas e trocando mensagens de ódio uns com os outros. E o que mais impressiona é a quantidade de likes que muitas destas postagens ganham. Mas o que explica estes comportamentos tão agressivos e violentos?

O vídeo do momento que está dando o que falar é sobre uma gerente de um restaurante que ao descobrir que alguns dos seus funcionários foram desrespeitados pelo pintor brasileiro, Romero Britto, foi tirar satisfação com o próprio. A mulher compareceu à loja do pintor, durante um encontro realizado pelo artista todo fim de mês, com uma obra dele em mãos e a jogou no chão.

A peça de porcelana, intitulada “Big Apple”, que valia em torno de R$ 26.000,00 (vinte seis mil reais) espatifou-se em pedaços. O intuito era de humilhá-lo na frente de todos que estavam ali presentes e disse para o pintor jamais aparecer no restaurante novamente e que nunca mais maltratasse seus funcionários.

Contudo, ela estava no direito de sentir-se indignada pelos relatos que recebeu de seus funcionários, mas não havia a necessidade de humilhar o artista daquela maneira, afinal de contas, incorreu no mesmo erro. Se o pintor Romero Britto maltratou ou não, nunca saberemos. A reflexão primordial é: mesmo o que a gerente do restaurante tenha dito seja verdade, um erro não justifica o outro, até mesmo porque violência (física ou verbal) só gera ainda mais violência.

Segundo o site de notícias G1, o vídeo foi divulgado por Faye Pindell, na plataforma digital TikTok e teve mais de 19 milhões de visualizações. Portanto, um fato que era para ter tido uma repercussão local, com as pessoas presentes na loja do pintor, tomou uma proporção internacional.

Um simples vídeo que viralizou na internet, assim como tantos outros, mas que expõe a vida de pessoas e flagra momentos constrangedores como este. A troca de quê, muitos likes? Que valores são estes que os novos hábitos e aparatos tecnológicos estão enraizando nas diversas culturas?

No entanto, vale ressaltar que também há muitas coisas bacanas e interessantes sendo divulgadas nas redes sociais, mas fica o questionamento para que não deixemos o senso crítico de lado.


Foto: Ilustrador Leonardo Amaral/Instagram @peixeaquatico

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