Entre a cruz e a espada ou "em cima do muro"?
O conflito de ideologias entre as atrizes Samantha
Schmütz e Juliana Paes evidencia uma discussão bastante complexa e polêmica a
respeito da obrigatoriedade do posicionamento político de pessoas, especialmente
de figuras públicas, no contexto de intensa bipolarização política no Brasil.
Até quando é possível ou permitido se calar diante das questões político-sociais
e econômicas do país, ainda mais durante a pandemia do coronavírus?
Após ser duramente criticada pela sua colega de
trabalho em razão da falta de engajamento político, Juliana Paes se manifestou
em sua rede social do Instagram para pedir que sua opinião seja respeitada e
que o fato dela não se posicionar com frequência, não quer dizer que ela não se
importe com os problemas do seu próprio país. Do outro lado, Samantha afirma
que pelo fato de ser uma pessoa pública, a sociedade exige uma postura mais ativa,
transparente e militante dos artistas em prol da luta pelos direitos sociais do
povo brasileiro, em virtude da grande influência que exercem e do senso de
responsabilidade que deriva do poder de representatividade de cada um deles.
A verdade é que a pressão sobre os artistas para se
posicionarem contra o Governo Bolsonaro está aumentando e muitos deles não
sabem o que fazer por medo de represálias, cultura do cancelamento, por não
desejarem expor suas crenças e ideologias pessoais, dentre outros. O problema é
tão sério que, além dos fãs e legião de seguidores nas redes sociais, diversos
atores estão cobrando o engajamento político de outros colegas, como no caso
presente.
Na entrevista concedida ao programa Saia Justa,
Samantha Schmütz relatou a sua forte indignação para com o Governo Federal atual,
as milhares de mortes de cidadãos contaminados pela Covid-19, em especial, a do
ator Paulo Gustavo e o recente bloqueio de seu perfil no Instagram em consequência
da forte militância contra a gestão do Presidente Bolsonaro. Uma frase da atriz
que me chamou bastante a atenção foi: - “Quem
não se posiciona, já está se posicionando”, no sentindo de quem não se
manifesta publicamente, subentende-se que é conivente com o governo Bolsonaro
ou é um “bolsominion” (termo depreciativo adotado pelos brasileiros para
qualificar fanáticos políticos e verdadeiros adoradores de Jair Bolsonaro).
Contudo, me questiono se este pensamento é o mais
adequado, justo ou até mesmo razoável, uma vez que vivemos numa democracia e
todos nós temos o direito de nos expressar livremente para defender nossas
ideologias e convicções e claro, o nosso direito de permanecer calados. E neste
quesito, eu concordo plenamente com o depoimento de Juliana Paes. Não somos
obrigados a fazer algo que não queremos só porque outras pessoas estão fazendo.
Cada um tem que respeitar a forma de ser do outro e está tudo bem em sermos e
pensarmos de modos diferentes. Afinal de contas, vivemos ou não numa
democracia?
A liberdade de expressão foi consagrada pela
Constituição Federal de 1988 justamente para defender o direito de todos de
falar publicamente o que pensam e de se posicionarem em sociedade sobre
questões relevantes, mas também de calarem-se quando assim optarem. Infelizmente,
a sociedade moderna não sabe administrar as liberdades que foram conquistadas as
duras penas e, muitas das vezes, se expressam de forma equivocada,
desrespeitosa; banalizam direitos ou se utilizam deles para ferir direitos de
outrem. Uma verdadeira lástima.
É notório o aumento da intolerância, da raiva, da
falta de diálogo entre as pessoas por elas internalizarem discursos e
ideologias de partidos políticos ou de autoridades públicas como se fossem a
verdade máxima e superior, sem perceber que independentemente de partido, o
povo brasileiro tem que ser protegido, enaltecido e respeitado. De um modo
geral, os brasileiros têm que entender que não se trata de lado A ou lado B; da
direita contra a extrema esquerda; de bolsominions contra mortadelas (termo
depreciativo para descrever os simpatizantes do PT), mas sim, dos cidadãos
brasileiros que precisam se unir para defender seus direitos e garantias, tanto
individuais quanto coletivas.
De fato, temos que reaprender a conviver com as
diferenças, especialmente as de cunho político, pois somos seres que vivem em
sociedade e dependem um do outro para desempenhar suas respectivas funções. Visto
que que determinadas pessoas não se posicionam ou não se expõem publicamente,
por quaisquer razões, não significa dizer que elas não se importam com a
situação do país em que vivem. Significa apenas que elas estão exercendo o
direito delas de não querer manifestar qualquer tipo de opinião.
O Brasil, em sua vasta extensão, possui realidades
múltiplas que coexistem e que estão em constante conflito, mas nem por isso
devemos impor as nossas ideologias e convicções. Você não tem que aceitar ou
concordar com o que o outro pensa e diz, mas tem o dever de respeitar e conviver
com cordialidade. Portanto, lembre-se: respeite a opinião do próximo, pois pode
ser da sua visão que as pessoas irão discordar e está tudo bem.
Foto: Reprodução/metropolis.com
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